Contrabando e desenvolvimento econômico na fronteira

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O Brasil, costuma-se dizer, é um país de dimensões continentais, fato que traz desafios enormes para os governantes e a sociedade. São mais de 16 mil quilômetros de fronteiras terrestres, que separam o país de dez nações sul-americanas, território que engloba também 120 municípios fronteiriços, que vão desde o Oiapoque, no Amapá, até o Chuí, no Rio Grande do Sul.

Realizado pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf) em parceria com a Empresa Gaúcha de Opinião Pública e Estatística (Egope), o estudo “Características das Sociedades de Fronteira” apresenta um panorama da situação socioeconômica desses municípios. Ele traz dados relevantes, mas talvez a conclusão mais importante seja a relação estabelecida entre o contrabando e os índices de desenvolvimento das cidades. Nos seis municípios classificados como as principais portas de entrada do contrabando no país, foram verificados índices muito abaixo da média nacional. Esses municípios são Coronel Sapucaia, Mundo Novo, Paranhos e Ponta Porã (MS) e Foz do Iguaçu e Guaíra (Paraná).

É preciso que a sociedade passe a olhar para as regiões de fronteira com mais cuidado

A média do PIB per capita desses seis municípios ficou abaixo de R$ 20 mil em 2013 (somente Foz do Iguaçu alcançou pouco mais de R$ 37 mil), pouco abaixo, portanto, da média nacional de R$ 26 mil, mas muito inferior à média de cidades como Rio de Janeiro (R$ 43.941) e São Paulo (R$ 48.275). Outro fator negativo que impressiona é a alta dependência financeira que essas cidades têm de verbas estaduais e federais. Em Foz do Iguaçu, 58,6% do orçamento anual vem dos governos do estado e federal. Mas em Coronel Sapucaia a situação é bem pior: apenas 6,22% de tudo o que o município arrecada tem origem no próprio município; 93,78 % vêm dos governos federal e estadual.

Esse cenário dá causa a uma situação muito perversa, já que, em momentos de crise para os estados ou a União, os municípios em questão ficam extremamente vulneráveis, podendo perder parcela significativa de seus rendimentos. Com isso, áreas que já possuem indicadores precários em educação e saúde ficam ainda mais vulneráveis. No ensino médio, as taxas de abandono variam de 2,8% em Mundo Novo, chegando a atingir 7,8% e 8% em Ponta Porã e Foz do Iguaçu, respectivamente.

Por fim, a segurança também preocupa. Como há uma carência de investimentos nesse setor, os municípios com pouquíssima capacidade financeira praticamente não investem nessa rubrica. Dos seis municípios citados, apenas três realizaram algum investimento nessa direção. Os números de óbitos por armas de fogo também se mostram elevados, como em Guaíra, onde foram registrados 62,13 óbitos desse tipo por 100 mil habitantes, contra 9,14 em São Paulo.

É preciso que a sociedade passe a olhar para as regiões de fronteira com mais cuidado. De maneira geral, os indicadores de todas as 120 cidades fronteiriças são inferiores à média nacional, pois se trata de regiões isoladas e com poucas oportunidades em termos de emprego e geração de renda. E os problemas ainda se agravam, e muito, nas cidades que também têm de enfrentar a mazela do crime de contrabando.

Precisamos de políticas públicas que reforcem as vocações desses municípios como forma de promover o desenvolvimento, mas que, ao mesmo tempo, combatam de maneira estruturada e firme crimes como o contrabando, o tráfico de drogas e de armas. É necessária a adoção de medidas que reduzam a enorme vantagem econômica que o crime organizado tem sobre a indústria nacional e que, hoje, é o principal atrativo para que essas quadrilhas continuem atuando nas regiões de fronteira e tornando cada vez mais precária a situação das populações locais.

Luciano Stremel Barros é economista e presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf).
Foto: Christian Rizzi

 

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